2-12-2013

 

Freiras judias, outra invenção da Inquisição

Duas irmãs sacrificadas à causa dos Inquisidores em 1673

 

 

Estes processos de duas irmãs freiras num Convento de Beja são reveladores do funcionamento da Inquisição Portuguesa. As duas foram presas após duas denúncias de importância diminuta, feitas por parentes, o que as tornava logo denúncias de qualidade pela falácia que vinha já desde o séc. XVI de que, quanto mais próximo fosse o parentesco dos denunciantes, mais críveis eram as denúncias. Depois da prisão, choveram as denúncias de judaísmo, pois o facto de já lá estarem dentro aliviava a consciência dos denunciantes.

O processo seguia seus termos normais até ao libelo (acusação). Seguia-se a defesa, que se iniciava pela contestação por negação. O réu negava ter a crença judaica e ter praticado cerimónias judaicas ou mesmo seguir costumes judaicos. Foi o que fizeram as duas freiras de Beja. Indicaram testemunhas que a Inquisição mandou ouvir. Todas estas foram unânimes em testemunhar a prática católica das acusadas e em afirmar que nunca lhes haviam conhecido práticas ou costumes judaicos. Foram pois consideradas “negativas” tal como acontecia sempre nestes casos. Mas, pasme-se! os réus eram considerados negativos sem razão, embora os depoimentos indicassem que eram negativos com razão!

Desde este momento, e partindo destas premissas, a vida das duas freiras passou a correr perigo. É que, na rotina da Inquisição, a única solução para o réu se defender da acusação de judaísmo era confessar, inventando crença na Lei de Moisés e declarações de judaísmo que supostamente fizera com outras pessoas, tendo ainda a obrigação de “acertar” em todos aqueles que o tinham denunciado! Era uma tarefa quase impossível!

Havia depois uma 3.ª fase que consistia em fazer mais denúncias de terceiras pessoas, para que a Inquisição as pudesse depois prender. Em geral, juntavam-se a 2.ª e a 3.ª fase, pois o réu, ao mesmo tempo que inventava a sua crença, ia fazendo denúncias, enquanto tentava adivinhar quem é que o tinha denunciado a ele.

Este era o único modo de sair da Inquisição vivo!

As duas freiras de Beja não estavam dispostas a entrar no jogo da Inquisição. Tiveram a ilusão de que conseguiriam defender-se da acusação de judaísmo. Afinal estavam as duas há 35 anos no Convento, nunca haviam sonhado em práticas ou crenças de judaísmo, apesar de lhes correr algum sangue judeu nas veias.  Possivelmente os advogados que lhes foram indicados como procuradores ainda as incitaram a confessar crença judaica, por saberem a impossibilidade da defesa que a eles estava confiada, mas elas terão ficado na sua e não o fizeram.

Rejeitada a contestação por negação (e era-o sempre!) era publicada a prova da justiça e os réus tentavam defender-se desvalorizando as testemunhas através de contraditas e coarctadas. Tentavam adivinhar quem haviam sido as testemunhas e alegavam que elas haviam sido movidas pelo ódio que lhes tinham, por esta ou aquela razão.  No caso das duas freiras, isso não serviu de grande coisa, pois os Inquisidores desvalorizaram os ódios alegados por se tratar de parentes muito próximos (irmãos e sobrinhos).

Aqui, tenho de fazer um parêntese para referir que, noutros processos, os inquisidores se abstiveram de condenar à morte os réus, ainda que negativos, atendendo à fraqueza da prova. Eram condenados a ir ao tormento e neste purgavam a culpa que, apesar de tudo, lhes davam os Inquisidores. Não eram de modo nenhum absolvidos, como já se escreveu. Faziam a abjuração em forma pelas culpas que lhes eram atribuídas; geralmente, não assinavam, porque não podiam, tendo a mão inutilizada pelo tormento.

No caso das freiras de Évora, os Inquisidores foram especialmente bárbaros, porque nem essa hipótese puseram; pelo contrário, preocuparam-se em desvalorizar as contraditas. Foram relaxadas sem apelo nem agravo, sacrificadas em nome de quê? Em nome da rotina da Inquisição, que receava perder a face se as absolvesse; isto apesar de os Inquisidores terem a certeza absoluta que estavam inocentes.

Estavam inocentes como todas, mas mesmo todas as freiras que foram condenadas pela Inquisição por judaísmo! Como é que seria possível no Convento guardar os sábados? Como é que seria possível andar mais bem vestidas aos sábados que nos outros dias? Como é que seria possível seguir a dieta judaica em relação a certas carnes ou peixes no Convento?

Mas não é este o principal argumento que quero utilizar para provar a inocência de todas as freiras presas. É que contra as freiras não há denúncias de cristãos ou cristãs velhos, mas apenas de cristãos novos e essas são todas falsas, faziam parte da rotina da máquina inquisitorial: denúncias a montante para a prisão e condenação, denúncias a jusante, confissão entre umas e outras, único modo de salvar a vida! Se tivesse havido qualquer coisa de judaico no Convento, as cristãs velhas seriam as primeiras a denunciar isso mesmo à Inquisição. Aliás, todas as freiras cristãs velhas, que depuseram, defenderam as duas rés das acusações de judaísmo.

Para salvar as aparências, de vez em quando a Inquisição instaurava uns processos por perjúrio, sobretudo quando os denunciantes tinham a ousadia de juntar alguns cristãos velhos aos cristãos novos que denunciavam. Infelizmente, por vezes, a condenação por perjúrio só chegava quando já tinham sido mortos pela Inquisição alguns acusados pelos perjuros. Um Inquisidor lamenta isso mesmo no assento da Mesa de 20-4-1635 no proc. n.º 10564, de Lisboa.

Tudo isto era de tal modo evidente no séc. XVII, que o assassínio (*) das duas freiras (tenho de lhe chamar assim, porque os Inquisidores bem sabiam da inocência delas) provocou na altura grande escândalo. Cito João Lúcio de Azevedo, na História dos Cristãos Novos Portugueses (pag. 306):

Em Novembro de 1673, houvera em Évora auto-de-fé, saindo nele a ser executadas duas freiras, as quais, segundo todas as informações, tinham morrido com os maiores sinais de ferventes cristãs. O relato, chegado a Roma, produziu escândalo, e não se podia crer no Vaticano em culpas de judaísmo, imputadas a criaturas que tantos anos tinham vivido em clausura e como católicas morriam.”

De Roma escrevia  o Residente Gaspar Abreu de Freitas ao Príncipe Regente em 7 de Abril de 1674:

Uma das cousas que mais sentiram foi a relação que tiveram daquelas freiras que queimaram em Évora que lhes parece cousa inaudita, vivendo tantos anos em clausura sempre como católicas, e morrendo como tais. E ainda em caso que aqui as achassem mui culpadas não haviam de sair a público nem mostrar que havia tal cousa, mas lá dentro as haviam de emparedar e consumir, como ordinariamente fazem a alguns hereges, e por crimes grandes, e a outros declaram por doudos, e os mandam meter no hospital separado que deles há onde acabam. “

Pois, apesar disto, ainda há no séc. XXI quem acredite na fábula do “criptojudaísmo nos conventos portugueses”, como intitulou a Prof. Georgina Silva dos Santos, da Universidade Federal Fluminense no artigo citado abaixo. O criptojudaísmo foi inventado pela Inquisição no séc. XVI, para ter uma tarefa que justificasse a sua existência durante séculos (a perseguição dos cristãos novos) em vez de desaparecer rapidamente por falta de objecto. No centro da máquina da Inquisição estava o ciclo “denúncias – confissões- mais denúncias” que se espalhava rapidamente apanhando todos os cristãos novos e a certa altura chegou também aos Conventos. Foi o que aconteceu no séc. XVII, desde logo nas prisões de Coimbra, nos anos 20 e 30, em que apanharam 58 freiras, das quais 8 tiveram segundo processo por perjúrio, pois tinham denunciado duas ou três cristãs velhas por engano.

Do mesmo modo que rejeito qualquer grãozinho de verdade à Confraria de Fr. Diogo, também entendo não terem qualquer validade as acusações de judaísmo feitas àquelas freiras. Por isso, não aceito a orientação do artigo de 1987 da Prof. Elvira Azevedo Mea, pelas razões apontadas.  Além disso, o artigo tem inexactidões:

- na pag. 242, diz que a Abadessa D. Branca Pais ou de S. José (Pr. n.º 2304, de Coimbra), abadessa de Nossa Senhora de Campos, “disse que …”; ora, consultando-se o seu processo, conclui-se que ela não disse ou confessou nada, o processo transcreve o depoimento de Soror Clara de Santa Maria (Pr. n.º 212, de Coimbra) que acusa a Madre Superiora, D. Branca Pais,  de ter dito aquilo. Não é a mesma coisa.  Note-se ainda que a denunciante, Soror Clara, teve depois, em 1633, um processo por perjúrio (Pr. n.º 212A, de Coimbra).

- pag. 243, nota 44 – Refere os processos por perjúrio, mas não os estuda. Vê-se destes processos que o que verdadeiramente contava não era a inventada crença judaica, mas sim o sangue judeu que corria nas veias das acusadas

- o episódio das freiras cristãs velhas que não consentiram que as freiras reconciliadas voltassem aos conventos é narrado demasiado à pressa. As cristãs velhas tinham a sua razão: se as outras haviam sido presas por terem sangue judeu, a reconciliação não lhes purificara o sangue, continuavam a ser na mesma rejeitáveis.

Nos anos 70 do séc. XVII, também muitas freiras do Alentejo passaram pelos cárceres da Inquisição, acusadas de judaísmo, embora apenas fossem relaxadas aquelas duas infelizes. Veremos ainda como duas freiras estiveram longos anos na prisão porque não houve coragem de lhes aplicar os tormentos a que tinham sido condenadas.

A Prof. Georgina Silva dos Santos seguiu a Prof. Elvira Mea, ao tomar à letra o que encontrou nos processos, o que é mais que falível. Desde o 2.º quartel do séc. XX, é uma pecha dos historiadores acreditarem em tudo o que está nos processos da Inquisição sem aferir um pouco se o que lá está é minimamente crível.

 

 

(*) Qualquer outra designação menor é eufemismo e falsidade. Por exemplo, aqui: “A tudo isto juntava-se a má imagem que o Santo Ofício tinha junto de cardeais e do próprio papa, que se opunham ao uso de testemunhas singulares e excessos no confisco, para além de lhe imputarem excessiva dureza, visível na condenação à pena máxima de algumas freiras e padres cristãos-novos, de que havia exemplos próximos. Em 1669, fora relaxado o Padre Luis Azurara, de Montemor-o-Velho, e em 1673, na Mesa de Évora, as freiras Maria da Vitória e Joana das Chagas.” em História da Inquisição Portuguesa - 1536-1821, de Giuseppe Marcocci e José Pedro Paiva, Lisboa, A Esfera dos Livros, 2013, pag. 204.

Note-se que o assassinato da mãe e da irmã do Padre Luis Azurara não foi menos bárbaro.

 

 

GENEALOGIA

 

António Lopes, lavrador e mulher Beatriz Dias tiveram entre outros:

A – Inês Dias casada com Rodrigo Henriques que tiveram:

                     1-Francisco Lopes Cardoso casou com Catarina de Castro e tiveram

                                        Rodrigo de Castro (Pr. n.º 549)

                                        Soror Ana Maria de Jesus (Pr. n.º 786)

                     2-Manuel Henriques – Pr. n.º 1317 -  AdF de 26-11-1673 – n.º 57, de 55 anos, casou com Catarina da Costa (Pr. n.º 6665) e tiveram

                                        João de Campos (Pr. 1046 – MF 7027) AdF em mesa em 14-5-1683, casou com Margarida Pestana – Pr. n.º 7285

                                        Rodrigo de Campos ou Henriques

                                        Noutel da Costa

                                        Francisco da Costa

                     3-António Lopes Henriques (o Prioste)  – Pr. n.º 8944 – n.º 54 do AdF de 3-4-1672—M.F. 296, casou com Clara Dias e tiveram

                                        Sebastião Lopes – foi para o Brasil

                                        João Baptista – está em Bordéus

                                        Martim ou Martinho Lopes – Pr. n.º 4704, da Inq. de Lisboa, residente em Santarém onde casou com Antónia de Figueiredo, cristã velha, de quem tem Francisco, de anos e Joana, de peito.

                                        Rodrigo Henriques – Pr. n.º 7811

                                        Inês Dias, casada com um francês – em Bordéus

                                        Maria Rodrigues – Pr. n.º 4791

                                        Joana Baptista – Pr. n.º 984

                                        Isabel da Encarnaçâo – Pr. n.º 9891

                                        Margarida Rodrigues ou Lopes – Pr. n.º 5532

                                        Brites Henriques ou Rodrigues- Pr. n.º 7682

                     4-Joana das Chagas – Pr. n.º 345   AdF de 26-11-1673, tinha 55 anos M.F. 3911, RELAXADA

                     5-Maria Vitória – Pr. n.º 2493  -  AdF, de 26-11-1673, tinha 47 anos  M.F. 3914, RELAXADA

                     6-Brites Henriques – Pr. n.º 2811 (n.º 19 do AdF de 26-11-1673), que casou com Jorge de Campos e tiveram:

                                       Rodrigo Henriques – Pr. n.º 8048 – em Mesa – 7-10-1672, advogado, casou com Fulgência dos Reis – Pr. n.º 5853

                                       João Fernandes de Campos – não aparece o processo – foi ao AdF de 15-2-1682 sob o n.º 38

                                       Soror Inês dos Anjos – Pr. n.º 347 – n.º 69 do AdF, de 26-11-1673

                                       Soror Leonor da Trindade – Pr. n.º 5741 – n.º 28 do AdF de 26-11-1673

                                       Noutel de Campos - Pr. n.º 7602 –  AdF de 3-4-1672, sob o n.º 53

                                       Soror Mariana da Apresentação – Não aparece o proc. – n.º 72 do AdF de 26-11-1673

 

B - Belchior Dias (Pr n.º 10042) que casou com Isabel Mendes (Pr. n.º 5707)  e tiveram

                    1-Francisco Lopes (Pr. n.º 10968) que casou com Isabel Rodrigues

                    2-Soror Maria dos Prazeres (Pr. n.º 3104)- AdF 15-2-1682 n.º 38 – tinha 53 anos

                    3–Soror Maria do Desterro, freira em S.ta Clara-Beja, falecida em Junho de 1668, indicada falsamente no proc. de  Ant. Lopes Henriques como Mariana do Deserto.

                    3-Pedro Fernandes Cardoso (Pr. n.º 3324 e 3324 A)

                    4-Brites Dias (Pr. n.º 6210) que casou com António Bocarro e tiveram:

                                      Soror Isabel da Trindade  - Pr. n.º 7018, tinha 48 anos, n.º 39 no AdF de 15-2-1682

                                      Belchior Dias, casado com Maria de Castro, de que tem dois filhos Diogo e António, de 6 e 4 anos

                                      Miguel Pereira, solteiro

 

 

Outras freiras do Alentejo presas nesta época:

 

Soror Leonor do Sacramento – não aparece o processo - AdF de 3-4-1672, n.º 27--- é natural de Lisboa

Soror Mécia do Deserto – Pr. n.º 6698  - AdF de 3-4-1672, n.º 42 — e irmã

Soror Joana das Montanhas, irmã da anterior – Pr. n.º 4784 – AdF de 3-4-1672 n.º 51, filhas de Lourenço Mendes e de Maria Cardosa (Pr. n.º 4299 – mesmo AdF n.º 85), naturais de Évora

Soror Inês de Belém – Pr. n.º 350 – natural de Serpa, n.º 70 no AdF de 26-11-1673

Soror Joana de S. José – Pr. n.º 346 – natural de Beja, n.º 71 no AdF de 26-11-1673

Soror Violante de S. Francisco – Proc. n.º 1902 – AdF de 26-11-1673—n.º 68, filha de Duarte Alves e de Mariana de Matos

Soror Ana Maria da Conceição – Pr. n.º 8288 A – natural de Alcácer, n.º 22 no AdF de 3-4-1672

Soror Catarina de S. José – Pr. n.º 7322 -  natural de Moura, n.º 18 no AdF de 3-4-1672

Soror Maria da Piedade -  Proc. n.º 2506, natural de Avis, filha de Manuel Lopes e de Isabel Henriques, n.º 67 do AdF de 26-11-1673

Soror Maria de S.to António, natural de Moura, filha de António Taveira de Sousa – não aparece o processo – abjurou em 11-7-1673 no seu Convento perante o Inquisidor Sebastião Dias Velho

Soror Inês da Visitação, natural de Beja – não aparece o processo – é o n.º 77 do AdF de 21-9-1670

Soror Mariana da Apresentação - não aparece o processo - é o n.º 72 no AdF de 26-11-1673

Soror Mariana de S. Bernardo – Pr. n.º 3398 – natural de Beja

Soror Margarida do Rosário – Pr. n.º 2499 – natural de Moura

Soror Inês dos Serafins – Pr. n.º 1875 - natural de Montemor-o-Novo

Soror Isabel dos Serafins – Pr. n.º 3209 – natural de Sousel

Soror Maria dos Serafins – Pr. n.º 4007 – natural de Torrão

Soror Mariana Josefa – Pr. n.º 4132 – natural de Portalegre

Soror Brites do Espírito Santo – Pr. n.º 6553 – natural de Lagos

Soror Catarina de S. Boaventura – Pr. n.º 3281 – natural de Moura

Soror Joana do Espírito Santo – Pr. n.º 9738 – natural de Vila Viçosa

Soror Inês dos Anjos- Proc. n.º 347 - natural do Alvito

Soror Catarina de S. José - Proc. n.º 7322 - natural de Moura

Soror Maria do Nascimento - Pr. n.º 1947 - natural de Moura

Soror Catarina Helena da Piedade - Pr. n.º 11424 - Religiosa do Convento da Esperança, natural de Beja

Soror Ana Maria da Conceição - Pr. n.º 8288, Religiosa do Convento Aracoli de Alcácer, de onde é natural

Soror Margarida do Rosário, não aparece o processo, Convento de S. Clara de Moura – abjurou em 11-7-1673  na Mesa da Inquisição

Soror Leonor da Trindade - Pr. n.º 5814 –, Convento da Conceição de Beja, natural do Alvito

Soror Leonor da Trindade - Pr. n.º 5741 , Convento de S.ta Clara extra-muros de Beja, natural do Alvito

Soror Ana Maria – não aparece o processo -  natural do Alvito, n.º 62 do Auto da Fé de 26-11-1673

Soror Catarina Francisca da Silva, de 29 anos, com sua irmã

Soror Isabel Maria da Silva, de 25 anos, com sua irmã

Soror Luisa Helena da Silva, de 21 anos, no Convento de S. Bento de Évora, donde são naturais, abjuraram no Convento em 27-1-1668

Soror Maria Josefa de S.to António - Convento de S.ta Clara de Moura - é o n.º 69 do AdF de 22-9-1670

Soror Leonor de S. Miguel - Pr. n.º 5815 A, natural de Moura, - Convento de S.ta Clara de Moura-AdF de 22-9-1670

Soror Maria Josefa de S.to António e Soror Leonor de S. Miguel  - Pr. n.º 13380 de Lisboa

Soror Ana Baptista, freira professa de véu preto no Convento de S.ta Clara em Moura – não aparece o processo, natural de Moura- abjurou  no Convento em 7-6-1671

 

NOTA: Salvo outra indicação, os processos são da Inquisição de Évora

 

P R O C E S S O S

 

 

Soror Joana das Chagas – Processo n.º 345, da Inquisição de Évora

fls. 2 – 7-10-1671 - Mandado de prisão

fls. 3 – 11-10-1671 – Entrada na prisão

CULPAS

fls. 4  Depoimento de 1-6-1671 de Martinho ou Martim Lopes Henriques, de 28 anos, sobrinho da ré – Proc. n.º 4704, da Inquisição de Lisboa-, natural de Alvito e residente em Santarém – Há nove anos e meio, no Convento, em Beja

fls. 5 v – Dep. de 17-9-1671 de António Lopes Henriques, irmão da ré – Proc. n.º 8944, da Inq. de Évora – natural e morador na vila de Alvito – Há oito anos, no Convento, em Beja

fls. 8 – O Promotor requer a prisão da ré, apenas com base nos dois depoimentos, alegando que as testemunhas “depõem contra a delata com declarações de judaísmo em forma e têm a qualidade de irmão e sobrinho e porque são bastantes para ser presa (…)”

fls. 8 - 19-9-1671 – Assento da Mesa propondo a prisão

fls. 9 – 25-9-1671 – Assento do Conselho Geral decretando a prisão

fls. 11 – 9-12-1671 – Dep. de Brites Dias, de 50 anos, prima da ré, filha de Gaspar Gomes e de Ana Botelho – Proc. n.º 2133, da Inq. de Évora – natural de Viana e moradora em Beja. Há oito anos, no Convento, em Beja.

fls. 13 – 2-9-1672 – Dep. de António Martins Rolo, de 71 anos – Proc. n.º 4940, de Évora – natural de Évora e morador no Alvito – Há oito anos, em Beja, na grade do convento.

fls. 14 – 21-10-1672 – Dep. de Rodrigo Henriques, advogado, de 43 anos, sobrinho da ré – Proc. n.º 8048, de Évora -, natural de Alvito e morador em Portel- Há 10 anos, no Convento, em Beja.

fls. 15 – 21-10-1672 – Dep. de Fulgência dos Reis, mulher do anterior, de 52 anos – Proc. n.º 5853, da Inq. de Évora – natural e moradora em Portel – Há 10 anos mais ou menos, no Convento de Beja.

fls. 16 v – 3-11-1672 – Dep. de Noutel de Campos, de 17 anos, sobrinho da ré – Proc. n.º 7602, de Évora – natural e morador no Alvito. - Há três anos no Convento em Beja

fls. 18 – 5-1-1673 - Dep. de Soror Mariana da Apresentação, filha de Jorge de Campos e de Brites Henriques, de 51 anos de idade, sobrinha da ré – não aparece o processo, figura na lista do auto de fé de  26-11-1673, sob o n.º 72 – natural do Alvito e moradora no Convento de S.ta Clara, em Beja – Há 15 anos, no Convento.

fls. 21 v – 5-1-1673 – Dep. de Soror Inês dos Anjos, de 37 anos, irmã da anterior e sobrinha da ré – Proc. n.º 347, de Évora – natural de Alvito e moradora no Convento, em Beja. – Há 15 anos, no Convento, em Beja.

fls. 24 v – 5-1-1673 – Dep. de Soror Leonor da Trindade, de 33 anos, irmã das duas anteriores e sobrinha da ré – Proc. n.º 5741, de Évora – natural de Alvito e moradora no Convento, em Beja. - Há 10 anos no Convento.

29 v – 18-1-1673 – Dep. de Soror Maria da Piedade, de 36 anos, natural de Avis e moradora no Convento de Beja – Proc. n.º 2506, de Évora – Há seis anos, em Beja, no Convento.

fls. 30 v 27-3-1673 – Outro dep. de Soror Mariana da Apresentação – Há 11 anos no Convento.

fls. 35 – 27-3-1673 - Outro dep. de Soror Mariana da Apresentação – Acrescenta mais nomes ao depoimento anterior.

fls. 37 – 11-7-1673 – Nova declaração da mesma Soror Mariana da Apresentação.

fls. 40 – 11-6-1673 – Outra declaração de Soror Inês dos Anjos

fls. 43 – 20-7-1673 – Outra declaração de Soror Leonor da Trindade

fls. 45 – 22-9-1673 – Dep. de Soror Ana Maria de Jesus, de 34 anos, sobrinha da ré, natural de Alvito e moradora no Convento da Conceição, em Beja – Proc. n.º 786, de Évora – Há treze anos e um mês, em Beja

fls. 47 – 5-10-1673 – Dep. de Brites Henriques, viúva de Jorge de Campos, irmã da ré, de 80 anos, natural de Alvito e moradora em Portel – Proc. n.º 2811, de Évora – Há 15 anos, em Beja, no Convento.

fls. 50 – “Traslado de uns artigos de contraditas e prova neles feita do processo de Soror M.ª da Vitória presa nesta Inquisição que os Srs. Inquisidores mandaram trasladar e apensar a este de sua irmã, Soror Joana das Chagas”.

As contraditas arguidas pela irmã respeitam sobretudo a questões de partilhas com os irmãos Francisco Lopes Cardoso (falecido há 15 anos), Manuel Henriques e António Lopes Henriques, a questões de dinheiros com o sobrinho João de Campos e também a uns quadros mandados para o Convento pela prima Brites Dias, que não foram devolvidos. Praticamente, as duas irmãs tinham relações tensas com toda a família.

Daqui em diante, inicia-se nova numeração do processo.

fls. 1 – 30-10-1671 – GENEALOGIA

Disse ter 55 anos, e ser natural de Alvito. Por parte de seu pai não tem tios nem tias. Sobre a família por parte da mãe, ver acima.

A genealogia foi dita com manifesta má vontade, omitindo muitos parentes ou dizendo que não lhes sabia o nome.

fls. 5 - 22-7-1672 – Sessão in genere

Respondeu negativamente a todas as perguntas.

fls. 9 - 30-8-1672 – Sessão in specie

Respondeu sempre que era tudo falso ou “que nunca tal passou”.

fls. 12 - 3-10-1672 – Admoestação antes do libelo. Libelo. Lido este, disse que era tudo falso, que contestava por negação e tinha defesa com que vir e queria estar com procurador.

fls. 14 - 10-10-1672 – Juramento do Procurador Manuel Rodrigues de Gusmão

fls. 15 - Traslado do libelo.

fls. 16 - Defesa, redigida pelo procurador. Diz a ré que veio aos 20 anos para o Convento donde nunca saiu. Nunca seguiu a dieta judaica, nunca guardou os sábados, que nunca distinguiu nas suas conversas cristãos velhos de cristãos novos.

fls. 19 - 21-10-1672 – Comissão ao Doutor Francisco Lourenço Magro, Prior de Baleizão e Comissário do Santo Ofício, para interrogar testemunhas. Indicadas as perguntas a fazer.

fls. 23 - 9-11-1672 – Apresentação da comissão. Audição das testemunhas

- Madre Maria da Madre de Deus, do Convento de Santa Clara de Beja, de 65 anos – Disse que a ré é boa cristã e cumpridora de todos os seus deveres religiosos.  Nunca viu que evitasse algumas carnes e peixes, proibidos pela dieta judaica. Que prefere conviver com cristãos velhos.

- Madre Arcângela de S. Miguel, de 54 anos – Como a anterior. Acrescentou que a viu de facto tratar com Luis Rodrigues, cristão novo, sobre venda de mercadorias produzidas no Convento.

- Madre D. Mariana Lobo, de 78 anos- Disse que a ré é boa cristã católica, cumpridora dos seus deveres. Não guarda os sábados e come de todas as carnes e peixes. Não trata com seculares e prefere falar com cristãs velhas.

- Madre D. Filipa de Brito, de 60 anos – Como a anterior

- Madre Antónia de Jesus, de 63 anos – Como as anteriores

- Madre Mécia Perdigoa, de 66 anos – Como as anteriores

- Madre Natália de Jesus, de 58 anos – Como as anteriores

fls. 32 - 24-1-1673 – Requerimento do Promotor para publicação da prova da justiça. Admoestação antes da publicação.

Publicação da prova da justiça (São as primeiras 11 testemunhas; Última: Soror Maria da Piedade). Lida esta, a ré disse que era tudo falso, que tinha contraditas com que vir e que queria estar com o procurador.

fls. 37 - Traslado da prova da justiça devolvido pelo procurador.  Este interrogou a Mesa para saber onde eram dadas as culpas à ré. Foi-lhe respondido que eram todas junto à cidade de Beja.

fls. 41 v - 27-1-1673 - Arguição de contraditas

Todas as inimizades referidas pela ré são no interior da família ou próximos. A principal é com seu irmão António Lopes Henriques, por causa das partilhas, depois, com João de Campos, seu sobrinho filho de sua irmã Brites Henriques, com Isabel da Costa (Pr. n.º 3224), cunhada desta e João da Costa, médico, filho desta, por causa de dinheiros. Pela mesma razão com os sobrinhos, filhos de seu falecido irmão, Francisco Lopes Cardoso, Rodrigo de Castro e Soror Ana Maria de Jesus.

Indica testemunhas às contraditas.

fls. 47 - 1-2-1673 – Despacho de recebimento das contraditas

fls. 49 - 7-2-1673 – Comissão ao Licenciado P.e José Souto Saramago para interrogar testemunhas na vila de Alvito

fls. 51 - 15-2-1673 – Apresentação da Comissão.  Audição das testemunhas:

- Dr. Francisco Soares, de 70 anos, do Desembargo do Rei – Sabe que na família da ré, não gostaram do casamento de António Lopes Henriques com Clara Dias, mas nada sabe dos ódios familiares entre eles

- Joana Rodrigues, de 62 anos, mulher parda e forra, que foi serva de Catarina de Morais, em Alvito – Sabe que na família não gostaram do casamento de António Lopes Henriques, irmão da ré; foram todos levar a ré ao Convento quando ela ali entrou menos ele.

- Sebastião Godinho da Rocha, de 52 anos, fidalgo da Casa Real, Ouvidor e Juiz dos Órfãos da vila de Alvito – Ouviu dizer que os pais da ré não haviam gostado do casamento do filho António Lopes Henriques, no que foram seguidos por todos os irmãos dela. Soube também que o falecido irmão Francisco Lopes dera um tiro de espingarda no seu irmão António.

- Maria Pacheca, de 60 anos, viúva que ficou de Agostinho Pereira- testemunho idêntico ao anterior.

fls. 57 - 6-2-1673 – Comissão ao Doutor Francisco Lourenço Magro, Prior de Baleizão e Comissário do Santo Ofício, para interrogar testemunhas no Convento de S.ta Clara em Beja.

fls. 59 - 23-2-1673 - Apresentação da Comissão.  Audição das testemunhas:

- Madre Antónia de Jesus, de 63 anos – era sabido publicamente que a ré não corria com seus irmãos. A inimizade era especialmente forte com António Lopes Henriques.  Teve ódio a seu cunhado Jorge de Campos, enquanto vivo e a seus filhos Rodrigo Henriques e João de Campos depois da sua morte.  Mais tarde deu conta que a ré falava com Rodrigo Henriques e sua mulher Fulgência dos Reis assim como com Noutel de Campos e sua mulher Violante Soares.

- Madre Arcângela de S. Miguel, de 54 anos – Sabe que a ré não corria com seu irmão António Lopes Henriques; no Convento a única inimizade que tinha nas cristãs novas era com Soror Inês da Visitação. Seu referido irmão, António também não falava com ela.  Havia inimizade entre a ré e Jorge de Campos, agora já defunto, mas ela dava-se bem com os filhos Rodrigo Henriques e Noutel de Campos e respectivas mulheres.

- Madre Filipa do Sacramento, de 54 anos – Disse que uma vez em que o irmão da ré António veio ao Convento ela não lhe queria falar e só o fez de má vontade. Sabe também das disputas que a ré teve com seu cunhado Jorge de Campos.  Porém, nunca houve inimizade dela com os filhos e filhas de Jorge de Campos.

fls. 66 - 20-7-1673 - Requerimento do Promotor para publicação de mais prova da justiça. Admoestação antes da publicação.

Publicação de mais prova da justiça – São duas declarações de Soror Mariana da Apresentação e outra de Soror Inês dos Anjos. Lida esta, a ré disse que era tudo falso, que tinha contraditas com que vir e que queria estar com o procurador.

fls. 69 - Traslado da prova da justiça devolvido pelo procurador. 

2.ªs contraditas

fls. 72 - 18-8-1673 – Nomeação de testemunhas

fls. 73 - 18-9-1673 -  Despacho de não recebimento das contraditas. Notificado à ré em Mesa no dia seguinte.

fls. 74 - 25-9-1673 - Requerimento do Promotor para publicação de mais prova da justiça. Admoestação antes da publicação.

fls. 76 - Publicação de mais prova da justiça – É a denúncia da sobrinha Soror Ana Maria de Jesus. Lida esta, a ré disse que era tudo falso, que tinha contraditas com que vir e que queria estar com o procurador.

Traslado da prova da justiça devolvido pelo procurador. 

fls. 77 v - 3.ªs contraditas

fls. 79 - 28-9-1673 – Nomeação de testemunhas.

fls. 80 - 26-9-1673 – Despacho de recebimento apenas de algumas contraditas cuja prova se considerou já feita no processo de sua irmã Maria da Vitória.

fls. 82 - 6-10-1673 - Requerimento do Promotor para publicação de mais prova da justiça. Admoestação antes da publicação.

fls. 83 - Publicação de mais prova da justiça. – É a denúncia de Brites Henriques, irmã da ré, de 80 anos. Lida esta, a ré disse que era tudo falso, que não tinha contraditas com que vir e que não queria estar com o procurador.  Apesar desta resposta, o Inquisidor mandou chamar o procurador.

Traslado da prova da justiça devolvido pelo procurador. 

Em nome da ré, o procurador oferece as contraditas já apresentadas anteriormente.

fls. 85 - 18-10-1673 – Despacho: “Visto como estando a Ré Soror Joana das Chagas com seu procurador não veio com contraditas a lançamos, e havemos por lançada das com que pudera vir (...)”.

fls. 87 - 27-10-1673 – Apresentação da comissão da Inquisição de Évora ao Doutor Vicente Vaz Ramos Limpo, Desembargador da Relação Eclesiástica da cidade de Évora, e Prior da Igreja Paroquial do Salvador da Cidade de Beja, para ouvir testemunhas no Convento de S.ta Clara, de Beja.

fls. 92 - 27-10-1673 – Audição das testemunhas

- Soror Ana Maria de Jesus, de 59 anos, Abadessa do Convento – Apenas sabe que a ré estava mal com seus irmãos, por questões de partilhas.

- Soror Antónia de Jesus, de 73 anos – Disse que a ré se queixava muitas vezes de seus irmãos, dizendo que eram seus inimigos.  E mais não sabia.

28-10-1673 –

- D. Mariana Loba, de 79 anos – Disse que a ré teve diferenças com seus irmãos e os nomeava por seus inimigos. E mais não sabe.

- Soror Maria das Montanhas – de 56 anos, natural de Mértola – Disse que a ré se queixava muitas vezes de que seus irmãos eram inimigos dela.  E mais não sabe.

fls. 97 - 28-10-1673 – O escrivão da diligência certifica que a Abadessa informou que as freiras Arcângela de S. Miguel e Filipa do Sacramento estão doentes no leito, uma sangrada doze vezes e a outra catorze e,”portanto,  incapazes de poderem vir à grade a dar seu testemunho.”

fls. 103 - 6-11-1673 – Assento da Mesa

“(…) e pareceu a todos os votos que a Ré estaria em termos de ser havida por convicta no crime de heresia e apostasia por que foi presa, e acusada, visto deporem contra ela 13 testemunhas da justiça de culpas de declaração de judaísmo em forma, a saber, António Lopes Henriques e Brites Henriques, que são seus irmãos, Brites Dias, sua prima, Martinho Lopes, Rodrigo Henriques, Noutel de Campos, Mariana da Apresentação, Inês dos Anjos. Leonor da Trindade, Ana Maria [de Jesus] seus sobrinhos, Fulgência dos Reis, sua parenta, Maria da Piedade, Religiosa do mesmo convento e André Martins Rolo, de igual qualidade com a Ré, e todas com certidão de crédito excepto a de Inês dos Anjos, que tem diminuição e o L.do André Martins a tem pelo Notário, sem embargo do que a Ré alegou, e provou nas contraditas com que veio, porque de todas elas se vem a provar que a Ré não corria com seu irmão António Lopes, contraditado nos art.ºs 1.2.3.4.5.e 6. assim por respeito de o mesmo se casar mal, como por dúvidas e demandas que teve sobre as legítimas de seus pais, e ainda que as mais das testemunhas deponham que depois disso se não falavam mais; contudo, é uma negativa improvável pelo modo com que as testemunhas perguntadas aos ditos artigos o depõem, porque bem podia a Ré falar com o dito seu irmão sem que elas o soubessem; além do que, o parentesco é tal, que tira toda a suspeita por mais causas que houvesse e a respeito das mais testemunhas não prova a Ré coisa alguma, porquanto no 17.º artigo em que a Ré articula, que em razão do ódio que lhe tinha Jorge de Campos, seu cunhado, lhe tinham o mesmo a mulher deste Brites Henriques e seus filhos, Noutel de Campos, Rodrigo Henriques e Fulgência dos Reis, mulher deste, pelas testemunhas perguntadas ao dito artigo 5.6.7., Soror Antónia de Jesus,  Arcângela de S. Miguel, Filipa do Sacramento, se prova contraproducentemente, porquanto depõem que a Ré tinha grades com eles e que vinham ao Convento e se carteavam com a Ré, e a respeito de suas sobrinhas Leonor da Trindade, Inês dos Anjos, Mariana da Apresentação, se não prova coisa alguma, antes duas destas foram para o Convento intercedendo ela em lhes agenciar o dote, como articula no 16.º artigo; nem nas contraditas apensas oferecidas por Maria da Vitória, irmã da Ré, cujo processo vai também ao Conselho, se prova mais que as dúvidas com o dito António Lopes, e a respeito da testemunha Brites Dias contraditada no 15.16.17 artigos das ditas contraditas, se prova coisa considerável, com que a prova contra a Ré é superabundante, e que portanto, a Ré, como herege apóstata da nossa santa Fé Católica, negativa e pertinaz, devia ser entregue à justiça secular, servatis servandis, e que incorreu em sentença de excomunhão maior e nas mais penas de direito. E assistiu a este despacho pelo Ordinário de sua comissão o Arcediago João de Sousa.”

 

fls. 105 - 10-11-1673 – Assento do Conselho Geral

“(…) está convicta no crime de heresia e apostasia, e que como herege apóstata de nossa santa Fé católica, convicta, negativa e pertinaz, seja entregue à justiça secular, servatis servandis (…”

fls. 107 – Sem data - Auto de notificação de que foi relaxada,  prevista no ponto II, XV, I do Regimento

fls. 109 - 24-11-1673 - Auto de notificação de mãos atadas, prevista em II, XV,V do Regimento.

Notificação feita na sexta-feira antes do auto de fé (no domingo seguinte). Ficou com a ré o Padre Miguel Dias, da Companhia de Jesus 

fls. 111 - Sentença

fls. 112 v - 26-11-1673 – Foi publicada a sentença no Auto de Fé realizado nesta data na Praça Grande da Cidade de Évora.

fls. 113 - Conta de custas: 7$143 réis.

 

 

 

 

Soror Maria da Vitória – Processo n.º 2493, da Inquisição de Évora

fls. 1 – 7-10-1671 - Mandado de prisão

fls. 2 – 11-10-1671 – Entrada na prisão

CULPAS

fls. 4 - Depoimento de 1-6-1671 de Martinho ou Martim Lopes Henriques, de 28 anos, sobrinho da ré – Proc. n.º 4704, da Inquisição de Lisboa-, natural de Alvito e residente em Santarém – Há nove anos e meio, no Convento, em Beja

fls. 5 v – Dep. de 17-9-1671 de António Lopes Henriques, irmão da ré – Proc. n.º 8944, da Inq. de Évora – natural e morador na vila de Alvito – Há oito anos, no Convento, em Beja

fls. 8 – O Promotor requer a prisão da ré, apenas com base nos dois depoimentos, alegando que as testemunhas “depõem contra a delata com declarações de judaísmo em forma e têm a qualidade de irmão e sobrinho e porque são bastantes para ser presa (…)”

fls. 8 - 19-9-1671 – Assento da Mesa propondo a prisão

fls. 9 – 25-9-1671 – Assento do Conselho Geral decretando a prisão

fls. 11 – 9-12-1671 – Dep. de Brites Dias, de 50 anos, prima da ré, filha de Gaspar Gomes e de Ana Botelho – Proc. n.º 2133, da Inq. de Évora – natural de Viana e moradora em Beja. Há oito anos, no Convento, em Beja.

fls. 12 – 21-10-1672 – Dep. de Rodrigo Henriques, advogado, de 43 anos, sobrinho da ré – Proc. n.º 8048, de Évora -, natural de Alvito e morador em Portel- Há 10 anos, no Convento, em Beja.

fls. 13 – 21-10-1672 – Dep. de Fulgência dos Reis, mulher do anterior, de 52 anos – Proc. n.º 5853, da Inq. de Évora – natural e moradora em Portel – Há 10 anos mais ou menos, no Convento de Beja.

fls. 14 – 3-11-1672 – Dep. de Noutel de Campos, de 17 anos, sobrinho da ré – Proc. n.º 7602, de Évora – natural e morador no Alvito. - Há três anos no Convento em Beja

fls. 15 – 5-1-1673 - Dep. de Soror Mariana da Apresentação, filha de Jorge de Campos e de Brites Henriques, de 51 anos de idade, sobrinha da ré – não aparece o processo, figura na lista do auto de fé de  26-11-1673, sob o n.º 72 – natural do Alvito e moradora no Convento de S.ta Clara, em Beja – Há 15 anos, no Convento.

fls. 18 v – 5-1-1673 – Dep. de Soror Inês dos Anjos, de 37 anos, irmã da anterior e sobrinha da ré – Proc. n.º 347, de Évora – natural de Alvito e moradora no Convento, em Beja. – Há 15 anos, no Convento, em Beja.

fls. 22 v – 5-1-1673 – Dep. de Soror Leonor da Trindade, de 33 anos, irmã das duas anteriores e sobrinha da ré – Proc. n.º 5741, de Évora – natural de Alvito e moradora no Convento, em Beja. - Há 10 anos no Convento.

fls. 27 – 18-1-1673 – Dep. de Soror Maria da Piedade, de 36 anos, natural de Avis e moradora no Convento de Beja – Proc. n.º 2506, de Évora – Há seis anos, em Beja, no Convento.

fls. 28 v - 27-3-1673 – Outro dep. de Soror Mariana da Apresentação – Há 11 anos no Convento.

fls. 31 – 27-3-1673 - Outro dep. de Soror Mariana da Apresentação – Acrescenta mais nomes ao depoimento anterior.

fls. 32 v – 11-7-1673 – Nova declaração da mesma Soror Mariana da Apresentação.

fls. 35 v – 20-7-1673 – Outra declaração de Soror Leonor da Trindade

fls. 37 v – 11-6-1673 – Outra declaração de Soror Inês dos Anjos

fls. 40 v – 22-9-1673 – Dep. de Soror Ana Maria de Jesus, de 34 anos, sobrinha da ré, natural de Alvito e moradora no Convento da Conceição, em Beja – Proc. n.º 786, de Évora – Há treze anos e um mês, em Beja

fls. 42 v – 5-10-1673 – Dep. de Brites Henriques, viúva de Jorge de Campos, irmã da ré, de 80 anos, natural de Alvito e moradora em Portel – Proc. n.º 2811, de Évora – Há 15 anos, em Beja, no Convento.

 

Daqui em diante, o processo inicia nova numeração.

fls. 1 - 17-10-1671 – GENEALOGIA

Declarou ter 49 anos. Que, por parte de seu pai não teve tios ou tias, de que tivesse notícia. Por parte de sua mãe teve dois tios, Francisco Lopes, Belchior Dias e uma tia, Joana.

Francisco Lopes casou com Leonor Lopes e tiveram uma filha, Inês Vaz (Pr. n.º 1876), que casou com João dos Campos.

Sobre Belchior Dias, ver quadro acima. Sua tia Joana faleceu sem filhos.

Referiu a seguir seus irmãos, ver quadro acima. Disse assim de seu irmão António Lopes Henriques: “O dito seu irmão António Lopes é morador em Alvito, não sabe que ofício que tem, e é casado com Clara Dias, x.n., não sabe que filhos tenha dela”.

Sabe ler e escrever.

fls. 4 - 22-7-1672 – Sessão in genere

Respondeu negativamente a todas as perguntas.

fls. 8 - 30-8-1672 – Sessão in specie

Respondeu sempre que era tudo falso ou “que nunca tal passou”.

fls. 11 - 3-10-1672 – Admoestação antes do libelo. Libelo. Lido este,  a ré disse que era tudo falso, que contestava por negação e tinha defesa com que vir e queria estar com procurador.

fls. 15 - 10-10-1672 – Juramento do Procurador Licenciado Crispim Luis

fls. 16 - Traslado do libelo devolvido pelo procurador.

fls.  17 - 10-10-1672 – Contestação por negação. Está no convento desde os 15 ou 16 anos, e sempre foi boa cristã e católica. Que sempre cumpriu as suas obrigações de cristã e de religiosa. Que sempre comeu todas as espécies de carne e de peixe. Que até matava um porco todos os anos e comia a carne dele. Que sempre fez o dia de descanso semanal aos domingos e não aos sábados.

Indica testemunhas.

fls. 19 - 18-10-1672 – Despacho de recebimento da defesa.

fls. 20 - 22-10-1672 – Comissão ao Doutor Francisco Lourenço Magro, Prior de Baleizão e Comissário do Santo Ofício, para interrogar testemunhas no Convento de S.ta Clara em Beja.

fls. 24 - 4-11-1672 – Apresentação da Comissão. Audição das testemunhas:

- Madre Ana Maria de Jesus, de 57 anos, Abadessa do Convento de S.ta Clara em Beja – Sempre teve a ré por boa e fiel cristã católica, embora só a conhecesse no Convento.  Que ela frequentava os sacramentos e cumpria todos os deveres de boa religiosa. Sabe que a ré comia toda a espécie de carne e de peixe. Que guardava os domingos e não os sábados. Que falava indiferentemente com cristãos novos e cristãos velhos.

- Madre Isabel dos Serafins – foi informado que tinha falecido no mês de Abril próximo passado.

- Madre D. Mariana Loba, de 78 anos – depoimento idêntico ao da Madre Abadessa.

- Madre D. Filipa de Brito, de 60 anos – como as anteriores

5-11-1672

- Madre Maria da Madre de Deus, de 60 anos – como as anteriores

- Madre Antónia de Jesus, de 73 anos – como as anteriores

- Madre Filipa do Sacramento, de 54 anos – como as anteriores

- Madre D. Francisca da Graça, de 50 anos – como as anteriores

- Madre Mariana de S. Bento, de 48 anos – como as anteriores.

fls. 35 - 24-1-1673 – Requerimento do Promotor para publicação da prova da justiça. Admoestação antes da publicação.

Publicação da prova da justiça (São as primeiras 10 testemunhas; Última: Soror Maria da Piedade). Lida esta, a ré disse que era tudo falso, que tinha contraditas com que vir e que queria estar com o procurador.

fls. 40 - Traslado da prova da justiça devolvido pelo procurador

fls. 44 v - 26-1-1673 - Arguição de contraditas

O pai da ré ficou muito zangado com o filho António Lopes Henriques, quando ele decidiu casar com Clara Dias, a filha de um sapateiro. Desde então, aquele filho teve o ódio de todos os irmãos e sobrinhos. O irmão da ré, Francisco Lopes Cardoso, falecido há 15 anos, chegou a atirar-lhe um tiro de espingarda.  Na distribuição da herança, o pai favoreceu as duas irmãs Joana das Chagas e Maria da Vitória, o que causou problemas à partilha dos bens  e originou mais zangas. A ré invocou ainda inimizades com seu sobrinho João de Campos, com Brites Dias e ainda outros elementos da família.

fls. 49 - 30-1-1673- Nomeação de testemunhas

fls. 54 - 31-1-1673 – Despacho de recebimento das contraditas. Foram recebidas 13 das 24 contraditas arguidas.

fls. 56 - Comissão da Inquisição de Évora ao L.do José Souto Saramago, para interrogar testemunhas às contraditas.

fls. 60 - 15-2-1673 – Apresentação da Comissão.  Audição das testemunhas:

- Maria Pacheca, de 60 anos, viúva que ficou de Agostinho Pereira, moradora em Alvito – disse que o pai da ré foi muito contrário ao casamento de seu filho António Lopes Henriques e por isso, todos os irmãos ficaram zangados com ele e não se falavam.

- Bernardo Fragoso de Matos, de 65 anos, morador no Alvito – Disse que um dia Francisco Lopes, irmão da ré, dera um tiro a António Lopes Henriques e o feriu; que todos os irmãos estavam zangados com o António Lopes Henriques.

- Isabel Gomes, solteira, de 52 anos – Os irmãos ficaram todos mal com António Lopes Henriques e não se falavam, mas depois parece que já se falavam, mas não está bem certa.

- Rodrigo Barreto Furtado, de 64 anos, morador no Alvito – Como os anteriores.

fls. 68 – Jerónimo Correia de Miranda, Escrivão do Judicial e Notas da vila de Alvito, certifica que não achou o livramento que se lhe pedia entre António Lopes Henriques e Francisco Lopes.

fls. 69 - – Comissão ao Doutor Francisco Lourenço Magro, Prior de Baleizão e Comissário do Santo Ofício, para interrogar testemunhas. Indicadas as perguntas a fazer.

fls. 73 - 24-2-1673 – Apresentação da comissão. Audição das testemunhas

- Madre Filipa do Sacramento, de 54 anos – Sabe das incompatibilidades entre a Ré e seus irmãos, sobretudo com António Lopes Henriques, por causa do casamento deste contra a vontade do pai e, a seguir, por causa da herança, quando o pai faleceu.

- Madre Arcângela de S. Miguel, de 54 anos – Sabe que a Ré não corria com seu irmão António Lopes Henriques e também tinha dúvidas com Soror Inês da Visitação que foi presa pelo Santo Ofício.  Havia muita indiferença com seus irmãos, por parte da Ré, em virtude de divergência nas partilhas dos bens de seus pais. Por essas razões, a Ré não tratava com seus irmãos há mais de 20 anos.

- Madre D. Mariana Lobo, de 78 anos- Como a anterior

- Madre Bernardina de Jesus, de 47 anos – Como as anteriores

- Madre Francisca do Rosário, de 35 anos – É nova no Convento, mas sempre ouviu dizer que a Ré estava de mal com seus irmãos por causa das partilhas dos bens da herança de seus pais.

- Madre Filipa de Brito, de 60 anos – Sabe que a Ré tem muita inimizade com seus irmãos por questões suscitadas pela partilha dos bens de seus pais.

- Madre Isabel dos Serafins – constatou-se que havia falecido no mês de Abril próximo passado.

-Francisca de S. João, de 38 anos, Leiga no Convento – Conhece a Ré e sabe que ela teve uma diferença com Soror Inês da Visitação por causa do fumo de uma fogueira que esta tinha feito no Claustro do Convento, e que entrava na casa da Ré.

- Madre Antónia de Jesus, de 54 anos – Sabe que a ré teve uma pendência com Soror Inês da Visitação, por causa de um fumo de uma fogueira feita por esta que entrou pela janela da casa da ré.  Sabe também que a ré tem inimizades com alguns de seus irmãos e sobrinhos.

- Manuel de Faria, de 28 anos, carpinteiro, natural e morador em Beja – Disse que Brites Dias (Pr. n.º 2133), prima [afastada] da ré, filha de Gaspar Gomes e de Ana Botelho, casada com Simão Lopes, por ocasião de meter no Convento de S.ta Clara uma sua filha, que ficou em casa da ré e de sua irmã, deu à ré dois quadros de valia, para se livrar das pessoas que lhos pediam emprestados. Sua filha morreu passados dois meses e a Brites Dias pediu os quadros de volta, mas a ré e sua irmã não lhos deram. Entretanto, Brites Dias foi presa pela Inquisição. Só mais tarde é que, por intercessão de Miguel Pereira, segundo sobrinho da ré, é que esta e sua irmã restituíram os quadros.

- Noutela Dias, de 50 anos – Em casa de seu patrão Belchior Dias, ouviu falar da inimizade de António Lopes Henriques com seus irmãos e em especial com as irmãs freiras. Também ouviu dizer que Brites Dias, filha de Gaspar Gomes, ficou zangada com a ré quando, após a morte de uma sua filha que vivia com a ré, pediu a esta a restituição de uns quadros que ela não quis fazer.

fls. 85 – Documento de difícil leitura que se refere a foros.

fls. 96 – 7-5-1673 – A ré pediu para estar com procurador

fls. 99 – 20-7-1673 - – Requerimento do Promotor para publicação da prova da justiça. Admoestação antes da publicação.

Publicação da prova da justiça – São duas denúncias de Soror Mariana da Apresentação e uma de Soror Inês dos Anjos.

fls. 102 – Traslado devolvido pelo procurador.

21-7-1673 – Estância com o procurador e arguição de contraditas por parte deste.

São arguidas contra Francisco Lopes Cardoso, irmão falecido da ré, João de Campos, sobrinho, Rodrigo Henriques, a mulher deste, Fulgência dos Reis,  e Noutel de Campos, também sobrinhos.

fls. 106 – 16-8-1673 – Nomeação de testemunhas

fls. 108. – 18-8-1673 – Despacho de recebimento das contraditas

fls. 110 – 21-8-1673 - Comissão da Inquisição de Évora ao L.do José Souto Saramago, para interrogar testemunhas às contraditas.

fls. 111 – 24-8-1673 – Certidão em como Francisco Lopes Cardoso, irmão da ré, faleceu em 9 de Setembro de 1651.

fls. 114 – 19-8-1673 - Comissão ao Doutor Francisco Lourenço Magro, Prior de Baleizão e Comissário do Santo Ofício, para interrogar testemunhas. Indicadas as perguntas a fazer.

fls. 118 – 22-8-1673 – Apresentação da comissão anterior. Audição das testemunhas na grade do meio do Convento de S.ta Clara em Beja.

- Madre Filipa do Sacramento – Sabe que por causa das partilhas da herança dos pais, a ré ficou zangada com seus irmão António Lopes Henriques e Manuel Henriques, e com os sobrinhos João de Campos e Rodrigo Henriques.  Quando lhe apareciam os irmãos no Convento, não pedia grade para eles e se ia à portaria falar com eles, era apenas para os descompor.

- Leonor da Ascensão, de 33 anos, criada da Madre Mariana da Visitação – Sabe das inimizades da ré com seus irmãos e que ela não queria falar com eles.

- Catarina de S. Domingos, de 50 anos, criada de Madre Isabel da Ascensão – como a anterior

- Madre Ana Maria de Jesus, de 57 anos –

fls. 123 – 12-6-1666 – Documento pelo qual João Fernandes de Campos se obriga a dar à Madre Abadessa do Convento de S.ta Clara em Beja, 100 000 réis de dote de sua irmã Leonor da Trindade, que ali professou.

fls. 124 – 4-9-1673 – A ré pede para estar com o seu procurador

fls. 126 – 6-9-1673 – O procurador requer que lhe seja indicado o lugar onde são dadas as culpas à ré nas últimas denúncias notificadas.  O Promotor responde que é junto à cidade de Beja.

fls. 127 – A ré argui 3.ªs contraditas pelo seu procurador.

fls. 128 – Nomeia testemunhas

fls. 129 – 23-9-1673 - Requerimento do Promotor para publicação da prova da justiça. Admoestação antes da publicação.

Publicação da prova da justiça – É a denúncia de Soror Ana Maria de Jesus. Ouvida a leitura, a ré disse que era tudo falso e que queria estar com o Procurador.

fls. 132 – Traslado devolvido pelo procurador.

fls. 132 v – Arguição das 4.ªa contraditas

fls. 135 – Nomeação de testemunhas

fls. 137 – 6-10-1673 - Requerimento do Promotor para publicação da prova da justiça. Admoestação antes da publicação.

Publicação da prova da justiça – É a denúncia de Brites Henriques, irmã da ré. Ouvida a leitura, a ré disse que era tudo falso e que queria estar com o Procurador.

fls. 139 – Traslado devolvido pelo procurador.

fls. 139 v – Argui contraditas contra seu sobrinho Rodrigo Henriques.

fls. 141 – Nomeia testemunhas

fls. 142 – Acrescento às contraditas

fls. 144 – Nomeação de testemunhas

fls. 146 – 18-8-1673 – Despacho de recebimento das contraditas. Foram recebidos o art.º 4.º das 3.ªs contraditas por António Lopes Henriques, Brites Henriques, irmãos da ré, Martinho Lopes, Rodrigo Henriques, Noutel de Campos, sobrinhos; n.º 1 das 4.ªs por António Lopes Henriques  “e das 5.ªs e 6.ªs não havia que receber, vista sua matéria”.  (…) Foram vistas as contraditas com que tem vindo, e pareceu que das 1.ªs se recebessem os art.os 8.9.10.11, pela dita Ana Maria, filha de Francisco Lopes Cardoso, 13.14, pela dita Brites Henriques, irmã da ré e Rodrigo Henriques, seu filho, e Fulgência dos Reis, mulher deste, contraditados e das 2.ªs,  3.4 pela dita Brites Henriques, e dos demais não havia que receber, vista sua matéria, nem para que fazer prova aos 8.º e 11.º artigos das 1.ªs nem ao 3.º e 4.º artigos das 2.ªs, por estar já prova feita e para prova dos mais artigos se perguntem as testemunhas nomeadas na forma do Regimento, para que se passem as comissões necessárias.

fls. 149 – 19-10-1673 - Comissão da Inquisição de Évora ao P.e Frei Jorge da Madalena, da Ordem de S. Francisco, para interrogar testemunhas às contraditas.

fls. 151 – 24-10-1673 – Audição de uma testemunha no Convento de S.to António de Sines

- P.e Frei Bento do Rosário, de 51 anos – Conhece a ré há 20 anos, de quando era mordomo do Convento. De facto, ouviu falar da inimizade da ré com seus irmãos, mas não sabe bem os motivos; e que não se falavam.

fls. 156 – 30-101673 – Audição na Mesa da Inquisição de Évora, da testemunha

- P.e Fr. Francisco de S. Bernardino, da Ordem de S. Francisco, de 50 anos – Sabe que a ré se queixava de seus parentes e tinha inimizade com eles.

fls. 158 – 27-10-1673 – Apresentação de uma Comissão da Inquisição de Évora ao Doutor Vicente Vaz Ramos Limpo, Desembargado da Relação Eclesiástica  e Prior da Igreja do Salvador da cidade de Beja –

fls. 161 – 27-10-1673 – Audição das testemunhas na grade da Abadessa do Convento de Santa Clara

- Madre Ana Maria de Jesus, de 59 anos,  Abadessa do Convento – Ouviu a ré muitas vezes queixar-se e dizer que não falava com seus irmãos.

- Madre Bernardina de Jesus, de 45 anos – Sempre ouviu a ré dizer que os seus irmãos eram seus inimigos. Disse especificamente que António Lopes Henriques e Manuel Henriques eram seus inimigos.

28-10-1673 –

-Madre D. Mariana Loba, de 79 anos – Como as anteriores.

fls. 168 – 24-10-1673 - Comissão ao Doutor Francisco Lourenço Magro, Prior de Baleizão e Comissário do Santo Ofício, para interrogar testemunhas. Indicadas as perguntas a fazer.

fls. 172 – 30-10-1673 – Apresentação da Comissão. Audição das testemunhas na grade do Convento de S.at Clara

- Isabel de S.to Elias, de 60 anos,  Leiga no Convento, - Sabe que havia inimizade da ré com seus irmãos, cujo nome desconhece.

- Madre Serafina do Céu, de 35 anos – Como a anterior.

- Madre Maria do Lado, de 31 anos – Como a anterior

- Francisca de S. João, de 30 anos, Leiga -

- Madre Antónia de Jesus, de 73 anos

- Madre Bernardina de Jesus, de 45 anos

- Padre Fr. João da Conceição, de 47 anos, religioso do hábito de S. Francisco – Foi mordomo do Convento de S.ta Clara. Sabe apenas que havia problemas de dinheiros entre a ré e seus irmãos.

fls. 182 – 6-11-1673 – Assento da Mesa

“(…) e pareceu a todos os votos que a Ré estava em termos de ser havida por convicta no crime de heresia e apostasia por que foi presa e acusada, visto deporem contra ela 12 testemunhas de justiça de culpas de declaração de judaísmo em forma a saber, António Lopes Henriques e Brites Henriques que são seus irmãos, Brites Dias, sua prima, Martinho Lopes, Rodrigo Henriques, Noutel de Campos, Mariana da Apresentação, Inês dos Anjos, Leonor da Trindade, Ana Maria, seus sobrinhos e Fulgência dos Reis, sua parenta, e Soror Maria da Piedade, Religiosa do mesmo Convento, todas de crédito excepto Soror Inês dos Anjos, sem embargo das contraditas da Ré, porque ainda que prove que teve dúvidas e diferenças com seu irmão António Lopes, e que não corria com ele, e as mais das testemunhas deponham que se não falavam, contudo a testemunha 5.ª Filipa do Sacramento, fls. 119 VI, mostrando querer favorecer a Ré como as mais das testemunhas por serem religiosas do mesmo Convento o fazem, depõem que a Ré não pedia grade para falar com seus irmãos, e se lhe falava na portaria, era para se descompor com eles, de que bem se colhe que o dito António Lopes ia ao dito Convento, e falava com a Ré, e suposto tivesse queixas dele por se casar mal, e a respeito de demandas que tinha com o mesmo contraditado, nos art.ºs 1.2.3.4.5.6.7.8.11.12 das 1.ªs contraditas contudo não se presume dissesse de sua irmã falsamente e com efeito, a Ré teve a sua tença e houve concerto a respeito das legítimas de seus pais, e a respeito das mais testemunhas, não prova a Ré coisa considerável,  e somente as testemunhas geralmente depõem que a Ré se queixava de seus parentes quando a prenderam, e ainda antes, coisa muito ordinária em as pessoas que vêm com ânimo de negarem suas culpas, nem a contradita posta a Brites Dias, prima da Ré contraditada no 15.16.17 artigos das 1.ªs contraditas é de consideração, e o número e parentesco o é, e três sobrinhas Religiosas do mesmo, e que portanto, a Ré, como herege apóstata da nossa santa Fé Católica, negativa e pertinaz, devia ser entregue à justiça secular, servatis servandis, e que incorreu em sentença de excomunhão maior e nas mais penas de direito. E assistiu a este despacho pelo Ordinário de sua comissão o Arcediago João de Sousa.”

fls. 183 – 10-11-1673 – Processo concluso

fls. 184 – 10-11-1673 – Assento do Conselho Geral

 “(…) está convicta no crime de heresia e apostasia, e que como herege apóstata de nossa santa Fé católica, convicta, negativa e pertinaz, seja entregue à justiça secular, servatis servandis (…”

fls. 186 – 13-11-1663 - Auto de notificação de que foi relaxada,  prevista no ponto II, XV, I do Regimento

fls. 188 - 24-11-1673 - Auto de notificação de mãos atadas, prevista em II, XV,V do Regimento.

Notificação feita na sexta-feira antes do auto de fé (no domingo seguinte). Ficou com a ré o Padre Paulo Mendes, da Companhia de Jesus.

fls. 190 - Sentença

fls. 191 v - 26-11-1673 – Foi publicada a sentença no Auto de Fé realizado nesta data na Praça Grande da Cidade de Évora.

fls. 192 - Conta de custas: 10$198 réis.

 

 

 

 

Processo n.º 7018 – Soror Isabel da Trindade, presa com cerca de 40 anos em 22-11-1673, cuja mãe Brites Dias, casada com António Bocarro, era prima direita das relaxadas [1]

A Prof. Georgina Silva dos Santos fez desta freira a personagem principal do seu artigo, mas deixou muitas lacunas na descrição.

O processo tem as culpas (denúncias contra ela), as suas confissões e as denúncias que fez e foi a decisão da Mesa em 22-5-1675. Foi considerada diminuta, por não dizer de seu 2.º tio António Lopes Henriques e de uma sua tia freira chamada Mariana do Deserto. Por isso, foi condenada a ir a tormento ad faciem [2].

Esta é uma história interessante. Quando António Lopes Henriques fez as suas denúncias, culpou de judaísmo “Maria de S. António e uma irmã desta a que lhe esquece o nome, religiosas professas do dito Convento” (de S.ta Clara em Beja). O nome Maria de S. António está errado, porque o correcto é Maria dos Prazeres; o Inquisidor emendou à margem. Mas os Inquisidores tinham o vício de aproveitar as denúncias mesmo quando o deponente não dizia o nome e aqui, da segunda freira, irmã da primeira, escreveu o Inquisidor à margem “Mariana do Deserto”. Este era um jogo perigoso.  A pobre Isabel da Trindade foi acusada por não mencionar a tal “Mariana do Deserto”.  Em 13-6-1675, no processo n.º 3104, foi averiguar-se se existia ou não a tal “Mariana do Deserto” e concluiu-se que o nome correcto era Maria do Desterro, prima em 2.º grau da Isabel da Trindade, mas que falecera no Convento em Junho de 1668.

Parece não ter havido coragem para levar à sala do tormento a pobre freira que ficou na prisão durante 6 anos e 4 meses, sem que uma linha fosse escrita no processo. O Assento foi substituído em 24-11-1681 ("sem ofensa do julgado, vota-se de novo o processo") e o Conselho Geral mandou-a libertar por decisão de 5-12-1681.

A Prof. Georgina não viu que a presa não foi à sala do tormento e não assinala o longo tempo de prisão.

 

[1] Os graus de parentesco usados na linguagem vulgar não são correctos para indicar o parentesco quando os dois colaterais não estão no mesmo patamar. De facto esses graus contam-se pelo progenitor comum – 1.º grau - avô, 2.º grau - bisavô, etc. Aqui, o progenitor comum era avô das relaxadas, mas bisavô de Isabel da Trindade – colateral do 5.º grau em direito civil, do 3.º, em direito canónico.

[2] No tormento ad faciem, a ré é posta no banco e atada, mas não se inicia o tormento.

 

 

 

Processo n.º 3104, de Soror Maria dos Prazeres,  presa com cerca de 45 anos em 22-11-1673, cuja mãe, Brites Henriques, viúva de Jorge de Campos,  era prima direita das relaxadas.

O seu processo foi também a Assento da Mesa em 22-5-1675, e foi mandada ir a tormento por todos os votos. O Conselho Geral determinou em 23-7-1675, que no tormento da polé seria puxada até ao lugar do libelo.

Não foi ao tormento.

O processo tem novas sessões com a ré, onde ela faz mais confissões:

6.ª sessão de 14-1-1676

7.ª sessão – 9-2-1677

8.ª sessão – 15-3-1677

9.ª sessão – Exame – 17-10-1681

Num 2.º Assento da Mesa em 28-10-1681, alguns Inquisidores ainda queriam levá-la ao tormento, mas o Conselho Geral não concordou.

Com sua prima Isabel da Trindade foi ao Auto da Fé de 15 de Fevereiro de 1682.

 

 

 

Este documento, do Armário dos Jesuítas, só pode ter sido escrito pelo Padre Paulo Mendes, que assistiu Soror Maria da Vitória no Auto da Fé. Se fosse outro Jesuíta, teria falado das duas; ele não o pode fazer, porque isso poria em cheque o seu irmão na Religião, o Padre Miguel Dias, que assistiu a outra freira.

O modo de proceder da Inquisição salta aqui à vista: para não morrerem, as freiras deveriam ter denunciado aqueles que as tinham denunciado a elas.

 

 

 

Relação em que se expõem várias circunstâncias que mostravam inocência, cristandade e conformidade com a vontade de Deus, observadas em uma de duas irmãs (ambas Religiosas e Franciscanas) que foram condenadas a morrer queimadas pelo crime de heresia em Évora no Acto da Fé de 26 de Novembro de 1675, sem data nem assinatura.

(Armário dos Jesuítas, maço 30, n.º 54)

 

Na  cidade de Évora se celebrou Auto da Fé em 26 de Novembro de 1675; nele foram condenadas à morte duas Religiosas irmãs, filhas dos mesmos pais, as quais teriam 50 anos de idade, pouco mais ou menos, e quase todos tinham vivido na Religião, onde entraram muito crianças; em uma delas, a qual, se bem me lembro, se chamava Maria da Vitória, e a mais moça na idade, adverti as coisas seguintes:

Primeiramente, observei nela grande conformidade com a vontade de Deus, a quem repetidas vezes, oferecia a morte afrontosa, a que estava condenada, em satisfação de seus pecados; se bem que pelo crime de heresia não merecia tal castigo, pois estava nele inocente, como cristã que era, e religiosa, falava com Deus tão afectuosamente, e tanto de coração, ao parecer, que causava devoção e lástima em todos os que a ouviam.

De véspera de Todos os Santos até àquele dia, disse que jejuara a pão e água, e que fazia outras penitências, porque o coração lhe dizia que havia de morrer naquele mês. A outras pessoas ouvi dizer que se açoitava todas as noites e que, enquanto estivera presa, rezava sempre o ofício divino.

Estando já no Acto da Fé, se reconciliou por vezes ao Padre que lhe assistia, pedindo-lhe com muitas lágrimas que não a desamparasse até à morte. Neste tempo, saiu o Senhor da freguesia de Santo Antão para um enfermo, e é incrível a consolação que esta mulher mostrou de ver o SS.mo Sacramento, dizendo que Deus lhe fizera aquela mercê para que comungasse espiritualmente; já que os Senhores Inquisidores lhe tiravam o comungar na realidade. Vendo ali uma irmã ou sobrinha sua, que ela dizia a chegara àquele estado, lhe perdoou e pediu a Deus que lhe perdoasse, e a todos os que podiam ter culpa da sua morte: da qual acrescentava que facilmente se podia livrar, porque bem sabia que testemunhas tinha contra si, porém que não queria levantar a outrem e impor-se a si, um testemunho falso em matéria tão grave, e que antes queria morrer do que fazer tal ofensa de Deus.

Na casa da Audiência, vestindo-lhe o verdugo a alva, pediu-lhe que a tratasse com modéstia e que quando lhe quisesse dar o garrote, lhe atasse os pés muito bem, para que com a morte não se descompusesse, pois era esposa de Cristo. Aqui se tornou a confessar geralmente.

Indo já para a fogueira, encontrámos à porta do Rossio grande parte da Comunidade de S. Francisco, a quem a dita Religiosa e sua irmã pediram perdão do descrédito que causavam ao seu Convento, com aquela afronta, porém que soubessem que iam a morrer por não se impor[em] um falso testemunho.  Os ditos religiosos as acompanharam até à fogueira, e lhe assistiram à morte, e a muitos deles ouvi dizer que eram as religiosas mais observantes e edificativas que havia no seu Convento, e que nele tinham instituído uma devoção, que era estarem sempre duas Freiras em oração diante do Santíssimo e que elas comummente assistiam de noite.

Já junto da morte, pediu a um Religioso que, como expirava, lhe tirasse as contas que levava na mão, e um retrato de Nossa Senhora da Conceição, porque não queria que se queimassem.

É costume em Évora levarem o retrato do penitente, que vai pintado na samarra, entre duas figuras do diabo; olhando para esta pintura outras vezes dizia: “No dia do Juízo se saberá se levaram os diabos a minha alma ou se a levaram os Anjos”.

 

 

TEXTOS CONSULTADOS

 

Regimento do Santo Ofício da Inquisição de 1640

Online: http://legislacaoregia.parlamento.pt/V/1/7/20/p267

  

João Lúcio de Azevedo, História dos Cristãos Novos Portugueses, Clássica, Lisboa, 1975.

Online: http://www.archive.org

 

Corpo Diplomatico Portuguez contendo os actos e relações politicas e diplomaticas de Portugal com as diversas potências do mundo desde o século XVI ate aos nossos dias, de Luiz Augusto Rebello da Silva  (Visconde de Santarém) – Volume XIV, pag. 193 

 

Elvira Cunha de Azevedo Mea, "1621-1634, Coimbra. O sagrado e o profano em choque", in Revista de História das Ideias, vol. 9, 1987, pags. 229-248.

 

Georgina Silva dos Santos, Isabel da Trindade: o criptojudaísmo nos conventos portugueses seiscentistas, in Retratos do Império: trajetórias individuais no mundo português nos séculos XVI a XIX por Ronaldo VainfasGeorgina Silva dos SantosGuilherme Pereira das Neves - EdUFF, Editora da Universidade Federal Fluminense, 2006 - Brazil, pags. 333-340