16-12-2008

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O CONGO EM 1845

 

Roteiro da viagem ao reino do Congo, por A. J. de Castro, major da província de Angola

 

 

 

Anexo 1

ACORDO dado pelo Rei Henrique II, do Congo

(26-6-1845)

 

Eu, Dom Henrique 2.º Rei Católico do Congo, querendo testemunhar o grande apreço em que tenho a estima de Sua Majestade Fidelíssima  a Sr.ª Dona Maria 2.ª Rainha de Portugal, e dos Algarves, e bem reconsiderando o que me foi presente pelo seu Embaixador, o Capitão dos seus Reais Exércitos, António Joaquim de Castro, Cavaleiro de São Bento de Avis, encarregado de solicitar permissão, para que os Portugueses se possão estabelecer nos meus Domínios de Ambriz, ali colocar Autoridades Militares, Civis e Administrativas, e construir Fortalezas, que protejam o lícito comércio, evitando que por aquele ponto  sejam introduzidas fazendas por contrabando em manifesto prejuízo do meu Reino, e da minha aliada; querendo ao mesmo tempo estreitar mais as antigas relações de amizade entre as nações de Portugal, e Congo por meio da aproximação: Fui servido declarar perante toda a minha Corte, ouvindo os grandes do meu Reino, e de acordo com o dito Embaixador, que dou o meu pleno consentimento para que os Portugueses se estabeleçam nos ditos meus Domínios do Ambriz na forma já dita, com as condições dos cinco Artigos seguintes:

1.º - Que Sua Majestade Fidelíssima mandará reedificar uma das antigas Igrejas, que houveram na Corte deste Reino do Congo, entre as quais ainda existem as paredes de algumas aproveitáveis; e mandará as necessárias Imagens, a fim de que nela se celebrem todos os ofícios com decência, e se adore o verdadeiro Deus, desterrando a heresia que se introduz pelo abandono da Religião de Jesus Cristo Nosso Senhor.

2.º - Que terá sempre na dita Igreja um Missionário Apostólico, Vigário Geral, de bons costumes, que nos conduza pelo caminho da Fé.

3.º - Que terá igualmente sempre na Corte deste Reino, um mestre de primeiras letras que ensine, e guie a mocidade.

4.º - Que estes empregados, sejam pagos por Sua Majestade Fidelíssima, pois que a pobreza do Reino do Congo o não permite.

5.º - Que estabelecidos que sejam os Portugueses no Ambriz, terão obrigação de defender com as suas armas, e seus auxílios, o Rei do Congo, quando seja atacado pelos seus vizinhos dentro da sua mesma Corte.

Em testemunho do que assinei com o Embaixador de Sua Majestade Fidelíssima, e se fizerão dois do mesmo teor, que mandei selar com as minhas armas Reais, ficando um em cada uma das partes contratantes.

Feito em São Salvador do Congo, aos vinte e seis de Junho do ano do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de 1845.

 

Don Henrique 2.º

El Rei do Congo

 

Locus † sigilli

 

António Joaquim de Castro

 

AHU – Angola, Caixa de 1845

 

 

 

 Anexo 2

 

Carta do Rei do Congo Henrique II ao Governador Geral de Angola

4-7-1845

 

Eu, Dom Henrique segundo, El-Rei Católico e Senhor antiquíssimo do Reino do Congo.

Recebi a carta de V. Ex.ª de trinta e um de Maio, aos vinte e dois de Junho do corrente ano, com o mimo constante a relação junta, que V. Ex.ª me remeteu em nome de Sua Majestade Fidelíssima a Rainha Senhora Dona Maria Segunda, pelo seu  Embaixador, o Capitão António Joaquim de Castro: o que muito estimei e muito agradeço.

Por motivos políticos de Famílias de minha Corte, se resolveu o Infante meu Filho Dom Álvaro a ficar, e em seu lugar vai substituído o menor Dom Nicolau de Água Rosada de Sardónia, que Vossa Excelência enviará para a Corte de Lisboa, acompanhado com o Reverendíssimo Padre António Francisco das Necessidades, para beijar a mão a Sua Majestade Fidelíssima; e por sua menor idade vão as minhas instruções juntas à Carta dirigida a Sua Majestade; e logo que a mesma Augusta Senhora resolver de melhor modo os Negócios de minha Corte, reenviará o mencionado Infante em companhia do mesmo Reverendo Padre, e o Embaixador de Sua Majestade, o supradito Capitão, quando voltarem a Luanda.

Comunico dizer a Vossa Excelência que a guerra civil que me fez o Fidalgo Dom Álvaro Mabambo em mil oitocentos quarenta e um neste Reino, foi originada entre escravos em dia da Feira, onde houveram mortandades; e na mesma guerra se meteram os escravos do Hospício de Santo António, e da Sé Catedral deste Reino, para me despojarem do Trono, e colocarem nele aquele Fidalgo, ou outro.

Os mencionados escravos são rebeldes, por levantar armas contra mim, como conspirarem também contra o Reverendíssimo Padre Missionário, depois de lhe roubarem: não obedecem e não fazem serviço à Igreja, e aos seus Ministros, quando aqui estão; antes os maltratam, fiados de sua multidão; e melhor se informará do mesmo Reverendo Padre, e o Embaixador Capitão António Joaquim de Castro, o que neles observou; e por este motivo requeiro a V. Ex.ª os auxílios necessários de uma força Militar que Vossa Excelência julgar, por serem escravos do Padroado Régio de Sua Majestade Fidelíssima, para os castigar, e subjugar, remetendo os rebeldes a sua Real Coroa; o que participará à Augustíssima Senhora, pelos meus Filhos Dom Simão, e Dom André, Embaixadores, que conduzem a Dom Nicolau a entregar na presença de Vossa Excelência, igualmente o Embaixador de Sua Majestade, e o Reverendo Missionário. Remeto mais quatro peles de tigres, que por mim ofereço a Sua Majestade Fidelíssima, que Vossa Excelência enviará a Lisboa, e minha carta. Deus Guarde a Vossa Excelência por muitos anos.

Reino do Congo, de S. Salvador, quatro de Julho de mil oitocentos quarenta e cinco.

 

Dom Henrique Segundo

El Rei do Congo

 

AHU – Angola, Caixa de 1845.

 

 

 

 Anexo 3

 

Carta do Rei do Congo Henrique II ao Governador-Geral de Angola

29-6-1855

 

Ao Governador-Geral da Província de Angola

 

Por duas vezes tenho pedido ao Excelentíssimo Bispo que viesse a este Reino, mas ele o não quer fazer, e por isso agora só peço que, de entre Cónego António Francisco das Necessidades (que já aqui esteve), Cónego Manuel Monteiro de Morais e Padre António Cândido de Barros, se me mande um para baptizar, confessar e professar os Fidalgos meus súbditos e todo o meu povo, em cumprimento do segundo Mandamento da Santa Madre Igreja, que diz assim: “Todo o Cristão deve confessar-se ao menos uma vez cada ano, na certeza de que, não o fazendo, irá para o Inferno”. Eu fazendo este pedido por repetidas vezes, declino a culpa que me possa caber perante Deus, como Chefe do povo deste Reino, e como tal o competente para procurar-lhe o remédio espiritual para a salvação de suas almas. Em referência ao Cónego Necessidades, devo dizer que em épocas remotas Frei Máximo e Frei Rafael de Castro (sic) vinham a este Reino, uma, duas e três vezes por ano, administrar os Sacramentos da nossa Religião. Uma das razões porque peço em nome de Jesus, Maria, José, um Sacerdote, é para o enterro do cadáver do meu mano o marquês do Hembo D. Manuel, que se acha depositado, por falta de Sacerdote que o encomende. Por esta ocasião vos dirijo os meus louvores pelo castigo que fosteis dar ao Régulo do Ambriz, porque sendo ele outrora tributário dos Reis do Congo, há tempos a esta parte que já não tributa. Respeito à extinção do tráfico da escravatura, vou adoptar as medidas convenientes para castigar alguns dos meus súbditos; peço que envieis algumas espingardas. Nada tenho com que vos presenteie, porque hoje se não quer escravos. São portadores desta os meus filhos D. Domingos d’Água Rosada e Sardónia, e D. Álvaro d’Água Rosada e Sardónia.

Escrita no Palácio de São Salvador do Reino do Congo, aos vinte e nove de Junho de mil oitocentos cinquenta e cinco.

 

Dom Henrique segundo, Rei Católico do Congo

 

 

BOA, 1855, n.º 514.

 

 

 Anexo 4

 

El-Rei Católico do  Congo ao Reverendíssimo Cónego António Firmino da Silva Quelhas, Vigário-Geral do Bispado de Angola e Congo.

 

Recebi a vossa carta com data de seis de Agosto do corrente ano, e com ela seis livrinhos, contendo a Ladainha e várias orações em português, e os dois crucifixos que vos havia pedido, o que muito sincera e cordialmente vos agradeço.

Acreditai deveras que tomei parte muito particular na vossa nomeação para Vigário-Geral do Bispado de Angola e Congo, cujas obrigações sabeis realmente tão bem desempenhar; e estimo sobremaneira que me deis sempre notícias satisfatórias a vosso respeito.

Paço em S. Salvador do Congo, 14 de Dezembro de 1855.

 

D. Henrique 2.º, Rei Catholico do Congo

 

BOA, 1856, n.º 540

 

 

 

Anexo 5

 

 

Carta do Rei Henrique II do Congo ao Vigário-Geral de Angola

 

El-Rei Católico do  Congo ao Reverendíssimo Cónego António Firmino da Silva Quelhas, Vigário-Geral do Bispado de Angola e Congo.

 

A vossa carta de seis de Agosto último me foi entregue pelo Reverendo Cónego Domingos Pereira da Silva Sardinha, que vós mandastes em Missão a este Reino, na conformidade do meu pedido: tendo eu a asseverar-vos que este Sacerdote não desmentiu (nem tal era de esperar, à vista do vosso abono) a confiança que nele depositastes; pois que se mostrou muito zeloso no cumprimento dos seus deveres, administrando os Sacramentos da Santa Igreja, com toda a prudência precisa; o que, junto a outras boas qualidades que possui, o tornou digno da minha estima, e do respeito e consideração de todos os meus súbditos.

A não ser o vosso pedido e as atendíveis razões em que vos fundastes, tê-lo-ia por cá detido mais tempo; pois que não obstante os três meses de estada nesta Cidade, nem por isso pôde ministrar a todo o meu povo, que é imenso, o Pasto Espiritual de que tanto carece.

Concedendo pois licença ao dito Reverendo Cónego para regressar aí por estes dias, conto que vós, de acordo com o Governador-Geral dessa Província, fareis toda a diligência possível, como prometeis, para que amiudadamente se me mandem Missionários que catequizem, fortifiquem e imbuam o meu povo nas crenças da nossa Santa Religião Católica e Apostólica Romana.

Desejo-vos boa saúde e prosperidades, e dirigi-me sempre que possais, as vossas estimadíssimas letras.

 

Paço em S. Salvador do Congo, 14 de Dezembro de 1855.

 

D. Henrique 2.º, Rei Catholico do Congo

 

BOA, 1856, n.º 540

 

 

T E X T O S    C O N S U L T A D O S

 

António Joaquim de Castro, O Congo em 1845: roteiro da viagem ao reino do Congo, in Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa, S. 2, n.º 2 (1880), pags. 53-67

 

Wheeler Douglas L., Nineteenth-Century African Protest in Angola: Prince Nicolas of Kongo (1830?-1860), African Historical Studies, Vol. 1, No. 1 (1968), pp. 40-59

 

Bontinck F., Notes Complementaires sur Dom Nicolau Agua Rosada e Sardonia, African Historical Studies, Vol. 2, No. 1 (1969), pp. 101-119

 

Françoise Latour da Veiga Pinto, Le Portugal et le Congo au XIXe siècle : étude d'histoire des relations internationales, préface de Jacques Freymond, Paris, Fondation Calouste Gulbenkian. Centre Culturel Portugais, Presses Universitaires de France, 1972

 

P.e António Brásio (1906 - 1985), ANGOLA, Spiritana Monumenta Historica. Series Africanas,  Louvain: Nauwelaerts, 1966-1971, 5 vol.