2-4-2004

Sergey Ivanovich Taneyev

Сергей Иванович Танеев 

(1856 – 1915)

 

 

 

Começando a estudar piano aos cinco anos de idade, Sergei Taneyev foi um dos primeiros músicos da sua geração a ingressar no recém criado Conservatório de Moscovo. Nesta instituição, foi aluno de Nikolai Hubert (teoria e contraponto), Eduard Langer e Nikolai Rubinstein (piano) e também daquele que seria seu amigo pessoal e grande mentor no domínio da composição, Piotr Ilitch Tchaikovsky. Em janeiro de 1875, Taneyev estreou-se como pianista, tocando o Concerto em Ré menor de Brahms, em Moscovo. A 3 de Dezembro do mesmo ano, tocou a parte do solista na estreia moscovita do Concerto para Piano Nº 1 de Tchaikovsky, vindo a apresentar subsequentemente todas as obras para piano e orquestra do compositor russo. Em 1878 sucedeu a Tchaikovsky como professor de harmonia e orquestração e em 1881 assumiu a direcção das classes de piano de Rubinstein, após a morte deste. Em 1883 sucedeu a Hubert como professor de composição, vindo igualmente a dirigir a instituição entre 1885 e 1889. Ao longo da sua actividade docente, que se estendeu até 1909, Taneyev foi responsável pela formação de alguns dos mais importantes expoentes da futura escola russa, como Scriabine, Rachmaninov e Liapounov. O interesse de Taneyev pelo contraponto vocal, cujas origens estudou intensivamente, reflectiu--se na publicação de uma obra fundamental da teoria musical russa deste período: o Contraponto invertível de estilo rigoroso(Leipzig e Moscovo, 1909).

Taneyev foi um pianista de primeiro plano, mas a sua situação como compositor é paradoxal; é uma das figuras mais respeitada da história da música russa, mas as suas obras são raramente interpretadas fora do seu país natal. Como compositor, deixou uma obra vasta que engloba a música sinfónica e de câmara, a música para piano, a canção para voz e piano e uma ópera, mas o fulcro da sua actividade criativa foi, sem dúvida, a música coral, domínio em que produziu, para além de uma enorme quantidade de peças para vozes a cappella, diversas cantatas com acompanhamento orquestral, das quais as mais importantes são a Cantata op.1, São João Damasceno, para coro e orquestra, e a monumental Cantata op.36, Após a leitura de um Salmo.

      (Do programa)

 

 

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Irina Dolzenko

 

 

 

 

Esta página refere-se a um concerto que teve lugar na Fundação Calouste Gulbenkian em 17-10-2003, com o coro e orquestra dirigidos pelo Maestro russo Mikhail Pletnev -  Михаил Васильевич Плетнев – e a participação de quatro cantores russos:

Lolita Semenina – Soprano - Лолита Семенина

Irina Doljenko – Meio Soprano - Ирина Долженко

Mikhail Gubsky – Tenor - Михаил Губский

Andrei Baturkin – Barítono - Андрей Батуркин

A orquestra, reforçada com 24 instrumentistas, começou por executar “A Rússia desconhecida”, de Tchaikovsky, Suite em Ré maior, op. 43, muito agradável de ouvir.

Depois, a Cantata, op. 36, de Sergey Taneyev, Após a leitura de um salmo, uma obra grandiosa deste autor, ainda desconhecido entre nós.

Foi um belo concerto e nem se notaram dificuldades para o coro de cantar em russo. Os solistas demonstraram também muita categoria.

 

Lolita Semenina

 

 

 

 

 

 

Cantata op. 36, Após a Leitura de um Salmo (letra de A.C. Khomiakov)

Пo прочтении псалмa (слова A. С. Хомяковa)

 

 

 

 

 

 

 

    Земля трепещет: по эфиру
    Катится гром из края в край.
    То Божий глас; Он судит миру:
    «Израиль, Мой народ, внимай!

 

 

 

    Израиль, ты Мне строишь храмы,
    И храмы золотом блестят,
    И в них курятся фимиамы,
    И день и ночь огни горят.

 

 

 

    К чему Мне ваших храмов своды,
    Бездушный камень, прах земной?

 

 

 

    Я создал землю, создал воды,
    Я небо очертил рукой.

 

 

 

    Хочу – и словом расширяю
    Предел безвестных вам чудес;
    И бесконечность созидаю
    За бесконечностью небес.

 

 

 

 

 

 

 

    К чему Мне злато? В глубь земную,
    В утробу вековечных скал,
    Я влил, как воду дождевую,
    Огнем расплавленный металл.

 

 

 

    Он там кипит и рвется, сжатый
    В оковах темной глубины.
    А ваши серебро и злато –
    Лишь всплеск той пламенной волны.

 

 

 

    К чему куренья?

 

 

 

                                 Предо Мною

    Земля со всех своих концов
    Кадит дыханьем под росою
    Благоухающих цветов.

 

 

 

    К чему огни? Не Я ль светила
    Зажег над вашей головой?
    Не Я ль, как искры из горнила,
    Бросаю звезды в мрак ночной?

 

 

 

 

 

    Твой скуден дар.

 

 

 

                               Есть дар бесценный,
    Дар, нужный Богу твоему.
    Ты с ним явись, и, примиренный,
    Я все дары твои приму.


    Мне нужно сердце чище злата
    И воля крепкая в труде,
    Мне нужен брат, любящий брата,
    Нужна мне правда на суде».

 

Алексей ХОМЯКОВ                 

 

 

 

 

 

 

 

PRIMEIRA PARTE

 

1. (Coro) - Allegro tempestoso

 

A terra estremece,

O trovão rasga o céu em todo o lado.

É a voz divina que anuncia ao mundo:

«Israel, escutai meu povo!

 

2. (Coro dividido) - Andante sostenuto

 

Meu povo, tu me constróis os templos

E os templos brilham cobertos de ouro,

Queima-se lá o incenso,

Dia e noite ardem os fogos.

 

3. (Coro) - . Andante

 

Para que preciso eu das sumptuosas abóbadas dos templos,

Pedra sem alma, cinza terrestre?

 

Allegro molto

 

Eu criei a terra, criei a água,

Com a minha mão desenhei o céu.

 

Fuga à 3 soggetti

 

Se quiser, com a minha palavra posso alargar

Os limites das maravilhas de vós desconhecidas.

Eu observo o infinito,

Observo o infinito dos céus.

 

 

SEGUNDA PARTE

 

 

4. (Coro) - Allegro moderato

 

Para que preciso eu do ouro?

Nas profundezas da terra, no ventre das rochas eternas

Despejei, como se fosse simples água da chuva,

O metal fundido pelo fogo.

 

Allegro tenebroso – Fuga

 

Que ali ferve e se debate comprimido,

Preso nas profundezas escuras.

Os vossos ouro e prata

São apenas os salpicos desta onda ardente.

 

5. (Coro) – Andante

 

Para quê o fumo do incenso?

 

(Quarteto de solistas)

 

Diante de Mim

A Terra, de todos os seus recantos,

Exala o cheiro perfumado

Das flores cobertas de orvalho.

 

6. (Solistas e Coro) - Adagio ma non troppo

 

Para quê os fogos? Não fui eu quem acendeu

Os astros por cima das vossas cabeças?

Não sou eu, quem, como faíscas da fornalha,

Atira as estrelas na escuridão da noite?

 

TERCEIRA PARTE

 

7. (Coro) - Interlúdio: Allegro appassionato

 

Pobres são as vossas oferendas.

 

8. Ária (Contralto) - Adagio piutosto largo

 

Existe uma dádiva inestimável,

A dádiva que necessita o teu Deus,

Apresentai-te com ela e Eu, conciliado,

Aceitarei todas as tuas oferendas:

 

Preciso do coração mais puro que o ouro,

E de uma grande força de vontade no trabalho.

Eu preciso de um irmão que ame o irmão,

Preciso da verdade no julgamento.

 

 

9. (Coro dividido) - Adagio pietoso e molto cantabile

 

Preciso do coração mais puro que o ouro,

E de uma grande força de vontade no trabalho.

Eu preciso de um irmão que ame o irmão,

Preciso da verdade no julgamento.

 

Tradução de Arman Amirkhanian                   

 

 

 

Иоанн Дамаскин (слова A. К. Толстогo)

 

 

Иду в незнаемый я путь,
Иду меж страха и надежды;
Мой взор угас, остыла грудь,
Не внемлет слух, сомкнуты вежды;
Лежу безгласен, недвижим,
Не слышу братского рыданья,
И от кадила синий дым
Не мне струит благоуханье;

 

Но вечным сном пока я сплю,
Моя любовь не умирает,
И ею, братья, вас молю,
Да каждый к Господу взывает:
Господь!

 

В тот день, когда труба
Вострубит
мира преставленье, —
Прими усопшего раба
В твои блаженные селенья!»

 

 

 

 

Cantata op. 1, São João Damasceno

(Alexei Tolstoi)

 

Sigo o caminho que desconheço,

avançando entre o medo e a esperança;

apagou-se a minha vista, arrefeceu o meu peito,

meus ouvidos não ouvem, os meus olhos estão fechados;

estou deitado sem voz, sem movimento,

não ouço o choro fraterno,

e a fumaça azulada do incenso

não me leva o seu perfume.

 

 

Mas enquanto durmo, submerso em sono eterno,

o meu amor não morre.

E com ele rogo-vos, irmãos,

oremos todos apelando ao Senhor:

Deus!

  

 

No dia, em que as trombetas

anunciarem o fim do mundo,

recebe este Teu escravo defunto

no Teu paraíso celeste.

 

 

Tradução de Arman Amirkhanian

 

     

16 de Março de 2004 - Mikhail Pletnev regressou a Lisboa à frente da Orquestra Nacional Russa para actuar no ciclo das “Grandes Orquestras Mundiais”. Pena foi que o Coro Gulbenkian não tivesse cantado, como havia sido anunciado, as “Três canções russas”, Op. 41, de Rachmaninov.

Interpretou apenas (muito bem) a Cantata n.º 1 de Sergei Taneyev a S. João Damasceno.

A orquestra interpretou a seguir a Sinfonia n.º 4 de Tchaikovsky, com muita categoria, como era de esperar.

 

 

O Milagre da 4ª Sinfonia de Tchaikovski

Por CRISTINA FERNANDES3

PÚBLICO;Quinta-feira, 18 de Março de 2004

O último concerto do ciclo Grandes Orquestras Mundiais, organizado pela Fundação Gulbenkian, trouxe na passada terça-feira ao Coliseu de Lisboa a Orquestra Nacional Russa, sob direcção do seu titular, Mikhail Pletnev, na interpretação de um programa inteiramente preenchido com repertório russo. Infelizmente os inicialmente anunciados "Três Cantos Populares Russos", op. 41, de Rachmaninov - uma obra raramente cantada em Portugal - foram inexplicavelmente substituídos por uma das partituras mais tocadas de Tchaikovski, com o estatuto de verdadeiro "clássico popular"- o bailado "A Bela Adormecida", de que ouvimos quatro excertos: Introdução, Marcha, Entreacto e Valsa.

A interpretação teve um bom nível (ainda que com um ou outro ponto menos depurado: falta de transparência no início da Introdução, madeiras pouco precisas na Valsa...), mas deixou-nos na memória o inspirado solo do primeiro violino do Entreacto (beleza do fraseado, "cantabile" generoso). Pode dizer-se que estas peças iniciais funcionaram um pouco como "aquecimento" para o resto do concerto, já que na Cantata op. 1, "São João Damasceno", de Taneyev, a orquestra não só mostrou uma sonoridade de conjunto muito mais opulenta e equilibrada, como se tornou evidente um trabalho interpretativo profundo em conformidade com o plano dramático da obra - uma tocante meditação sobre a morte. A prestação do Coro Gulbenkian foi, em geral, eficaz (se bem que nem sempre perfeita) e expressiva, mas o seu menor amadurecimento da partitura face à orquestra teria inevitavelmente de se notar.

O ponto áureo do concerto surgiu na segunda parte, com a Sinfonia nº 4, de Tchaikovski. O virtuosismo técnico, uma sólida concepção da obra (não só de cada andamento, mas do todo, aspecto ainda mais essencial numa sinfonia cíclica) e a paixão colocada na interpretação contribuiram para uma leitura notável de uma das mais admiráveis e inquietantes obras do compositor russo. O ar sisudo, austero e impenetrável de Pletnev não podia ser mais contrastante com o manancial de emoções que emergiram da orquestra - a prova de que uma boa técnica de direcção pode transmitir tudo, sem necessidade de gestos supérfluos ou exibicionismo teatral.

Para além do rigor do maestro (por sinal, menos eficiente na direcção do Coro), impressionou a sua noção muito clara da arquitectura da obra, a forma como soube caracterizar cada complexo temático, o sentido dos contrastes, a gestão das dinâmicas, tensões e volumes sonoros. Um bom exemplo foi a condução do implacável tema do "destino" ao longo do primeiro andamento, levado a um pico de tensão emocional angustiante no final do desenvolvimento, bem em conformidade com o espírito da música de Tchaikovski. Os metais revelaram-se aqui uma das mais-valias da formação, em especial o naipe dos trompetes, de uma precisão e homogeneidade imaculada. O outro ponto forte foram as cordas, com uma sonoridade cativante e muito própria (caracteristicamente russa?), ficando a qualidade das madeiras um pouco abaixo. Para além do imponente e intenso final, não podemos deixar de destacar ainda a clareza dos "pizzicatti" do "Scherzo" (a sua sincronização é um teste implacável a qualquer orquestra), combinada com uma minuciosa paleta dinâmica e sugestivos efeitos de estereofonia.

EM RESUMO

Um concerto de elevado nível que ficará na memória pela notável interpretação da Sinfonia nº 4, de Tchaikovski.